Código Florestal: o que restou?
Depois de torturarem o Código, o veto funciona como uma espécie de salmora
Roberto Malvezzi (Gogó), na página do Brasil de Fato: www. brasildefato.com.br, 18/10/2012

O
Código Florestal brasileiro nasceu em 1934. Ali está seu nervo central.
Mas já nasceu pela preocupação de tantos naturalistas que, já naquela
época, sabiam perfeitamente da interface das florestas com ciclo das
águas, inclusive de sua agressividade a terrenos e territórios
desprovidos de vegetação, provocando enchentes e erosões. Era também a
manifestação do cuidado com as florestas, já em processo de dizimação.
Mas,
quando os militares chegaram ao poder, eles fizeram uma nova e profunda
modificação no Código (Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965),
estabelecendo uma série de referenciais agora derrubados pela Ditadura
Ruralista. Foi a lei que demarcou a proteção das matas ciliares,
nascentes, encostas, etc.
Essa lei não veio por
acaso. Os militares queriam implantar a ferro e fogo o capitalismo no
campo, através de grandes empresas, entrando pela Amazônia – depois o
Cerrado – e sabiam que alguma proteção aos mananciais e às florestas
tinha que ser implementada.
Então, o capital
devorou o Cerrado e as franjas da Amazônia. Pior, entrou pelas áreas de
proteção que garantem a água e a biodiversidade necessárias à natureza e
ao povo brasileiro para plantar cana, soja e pôr as patas do gado. Com o
avanço da consciência ambiental veio a cobrança dos crimes ambientais.
Então, para não pagar, os ruralistas mudaram a lei.
O
que restou dessa batalha? Não muito, se formos olhar em termos efetivos
de preservação de nascentes, rios, água de qualidade, biodiversidade
para as gerações futuras. O grande pulo do gato foi estabelecer uma nova
gradação, particularmente nos rios maiores, onde a necessidade proteção
caiu de 500 metros para rios com mais de 600 metros de largura, para
apenas 100 metros. Vejam com um exemplo.
O São
Francisco tem 2700 km de comprimento. Hoje não tem mais que 5% de matas
ciliares. Se fosse para ser recomposto em sua totalidade, com uma
extensão de 500 metros em cada margem, seria necessária a recomposição
de 2700 km2 de matas ciliares. Com a nova lei cai em 80% essa exigência,
ficando a exigência legal de apenas 540 km2. O problema não é somente a
vegetação: ai estão chácaras, mansões, clubes, tudo que faz a vida da
burguesia. Aí cada um pode tirar as suas conclusões.
Os
tais vetos de Dilma, no apagar das luzes, tem sua importância para os
rios menores, também para os pequenos agricultores, mas está longe de
sustentar uma visão científica e moderna do que seja riqueza natural e
sua importância para um povo. Depois de torturarem o Código, o veto
funciona como uma espécie de salmora. Aquele sorriso amarelo de quem
levou uma goleada de 10 x 1, mas ficou feliz por fazer um gol de honra
ao final do jogo.
Para evitar novamente falsas
interpretações, reafirmo que estou fazendo a comparação com o regime
militar no que toca ao Código Florestal. Então, repito a frase que
causou polêmica no texto anterior “Código Florestal: derrota humilhante”: “nem no Regime Militar sofremos uma derrota tão humilhante”.
Roberto Malvezzi (Gogó) é assessor da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
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